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Foto do escritorEvandro Debochara

Figuras da Linguagem (I): Benedito Valadares (1892-1973)


Benedito Valadares Ribeiro foi governador de Minas Gerais de 1933 a 1945. Consagrou-se não só como influente homem público como também por suas gafes vocabulares. Embora fosse tachado por muitos de iletrado, teve alguns livros publicados. Há quem afirme que estava longe de ser um ignorante. Já outros alegavam que ele sabia aliar a astúcia política à ausência de informação escolar. O fato é que, em seu tempo, correram o país dezenas de histórias protagonizadas por ele, não sendo, talvez, mais possível hoje saber o que é verdade e o que é mera piada.

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Conta-se que, numa ocasião, ao ler o pronunciamento escrito por seu oficial de gabinete, Benedito disse: "Patos de Minas é a cidade mais bonita de Minas, cuíca do mundo". Ninguém entendeu nada. Na verdade, o texto escrito pelo oficial dizia "quiçá", e não "cuíca".

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Já durante um comício em Caratinga (MG), tirou do bolso um papel e começou a ler:

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– Povo de Carangola...

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A seu lado, Juscelino Kubitschek, então chefe da Casa Civil do governo de Minas, corrigiu:

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– Governador, não é Carangola. É Caratinga.

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Benedito respondeu ali mesmo no microfone, diante de toda a praça:

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– É tudo a mesma merda.

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Quando o interventor de São Paulo, Fernando Costa, foi visitar Belo Horizonte, Benedito o levou ao jardim zoológico:

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– Este é o leopoldo.

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– Que leopoldo?

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– Ah, não... é o leonardo.

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Nem um, nem outro: era um leopardo.

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Certa vez, em plenário, o deputado udenista José Bonifácio questionou o então ministro da Justiça, Trancredo Neves, sobre uma carta enviada dos Estados Unidos por Benedito dizendo que o inglês falado na América era muito diferente do falado aqui no Brasil. Tancredo não confirmou nem desmentiu a existência da carta.

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Ao publicar seu romance "A Lua Caiu" (1962), circularam rumores segundo os quais ele teria escrito "A Lua Saiu", mas o revisor retirou a cedilha do título original – escrito com "ç".

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Certa vez foi à cidade de Curvelo (MG) para visitar a exposição de gado do município. No meio do discurso, declarou:

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– Quero dizer aos fazendeiros aqui reunidos que já determinei à Caixa Econômica e aos bancos do estado a concessão de empréstimos agrícolas a prazos curtos e juros longos.

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Lá do meio da plateia, alguém o corrigiu:

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– É o contrário, governador.

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Ao que ele respondeu:

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– Desde que o dinheiro venha, os pronomes não têm importância.

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Mais adiante, conversando com seu oficial de gabinete, sentiu sono e disse:

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– Ciro, vou dormir. Vou entregar-me aos braços de Orfeu.

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– Faltou um "m", doutor Benedito.

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– Não faltou, não, Ciro. "Orfeom" é instrumento musical. Eu tô é com sono mesmo.

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E foi dormir.

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