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Foto do escritorEvandro Debochara

Polícia Federal apreende acentos, tremas e hifens durante operação


Apreensão realizada pela Polícia Federal nos últimos meses faz parte da Operação Ipsis Litteris

Apesar do Acordo Ortográfico decretado em 2009 ter se tornado obrigatório a partir de 2016, muitos usuários do português, por desconhecimento ou desobediência civil, continuam fazendo uso ilegal da ortografia vencida, vedada em todo o território nacional. Só no primeiro semestre deste ano, a Polícia Federal, por meio da investigação batizada de “Operação Ipsis Litteris”, já apreendeu milhões de hifens, tremas e acentos que estavam sendo usados em desacordo com as novas regras. Tais sinais foram flagrados e confiscados até em jornais de renome, documentos oficiais e obras acadêmicas (sendo ignorados seus empregos nas redes sociais, onde o barbarismo reina e a ortografia não tem jurisdição). Entre as grafias antigas consideradas de maior periculosidade pelas Polícias Federal, Civil e Militar, estão “anti-fascista”, “amigo-da-onça”, “boa-noite-cinderela”, “boca-de-fumo", “cavalo-de-tróia”, “Coréia [do Norte]”, “esteróide [anabolizante]”, “fora-da-lei”,“gonorréia”, “hemorróida”, “[organização] não-governamental”, “seqüestrador” e “lingüista”.

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O diretor da Delegacia de Crimes de Lesa-Ortografia reforça exceções: “Espécies animais e botânicas, como ‘dama-da-noite’, ‘maria-sem-vergonha’, ‘diabo-da-tasmânia’, ‘não-me-toques’ e ‘comigo-ninguém-pode’, continuam gozando do direito de andarem hifenizadas”. Tais prerrogativas revoltam os folcloristas, que protestam contra a não inclusão, nessas mesmas exceções, de espécies sobrenaturais como “mula-sem-cabeça” e “pai-do-mato”, cujos hifens foram confiscados em 2009.

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As queixas não param por aí. Desde a decretação da nova ortografia, redatores de jornais reclamam da abolição do acento diferencial, ainda usado para distinguir “pôr” de “por”, “pôde” de “pode” e “fôrma” de “forma”, mas vedado para distinguir o verbo “para” da preposição “para”: “Se publicamos algo como ‘Trânsito para o centro da cidade’, por exemplo, leitores ficam em dúvida se isso significa o tráfego em direção ao centro ou se o trânsito paralisou toda a região. Pior ainda se rola ‘Greve de ônibus para São Paulo’”, observou um jornalista que participou da última edição do Manual da Redação da Folha de São Paulo. O fato é que, até mesmo na informalidade da internet, o tal acento diferencial faz falta: “pera” pode ser tanto um pedido de espera quanto aquele fruto que perdeu seu circunflexo.

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Já profissionais do mundo da moda continuam inconformados com a retirada de hifens de tomara-que-caia: “Como posso escrever ‘Tomara que caia na passarela’ sem correr o risco de acharem que estou desejando algum mal às modelos?”, questionou o estilista Alexandre Herchcovitch.

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Durante os protestos de ontem, manifestantes foram presos por ostentarem faixas com os dizeres “não-violência”, “não-discriminação” e “não-agressão” – todos hifenados – e se queixaram do que consideram um abuso de autoridade da Academia Brasileira de Letras, já que nenhuma regra do Acordo proíbe o hífen em expressões contendo “não” como prefixo. “Em vez de deter quem luta por hífen para todos, a polícia deveria era prender os fascistoides, que continuam acentuando o ditongo nesse nome deles e nunca tiveram empatia pela ortografia antiga e tampouco pela atual”, protestou Alex Harlen, professor de português do Instituto Federal de Brasília (IFB).

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