O pronome oblíquo átono se saiu ontem do BBB-PB (spin-off do BBB dedicado ao Português Brasileiro). Primeiro eliminado da atual edição do reality language, com 49,31% dos votos dos usuários da língua, o clítico foi o convidado de hoje do programa Mais Você, apresentado pela linguista Ana Maria Braga, que, como de costume, recebe a palavra excluída da língua pelos falantes na manhã seguinte ao paredão. A entrevista começou com um desabafo: “Lá dentro da casa, desde o início eu já estava praticamente eliminado: os participantes levantam da cama, mas nunca se levantam da cama. Gripam, mas nunca se gripam. Formaram em algum curso universitário, e nunca se formaram em curso algum. Aposentaram, mas nunca se aposentaram. Vivem mudando pra outros quartos, mas nunca se mudam pra quarto algum. Querem classificar para o Top 5, mas nunca se classificam pra nada. Enfim, lembram de mim, mas nunca se lembram de mim”. Ana Maria se compadeceu da palavra, mas lhe mostrou algumas críticas de ex-colegas da casa: “Ele se acha... se sente o tal, mas muitas vezes não passa de um pseudorreflexivo”, disse outro pronome oblíquo átono, o clítico me. “Ora, mas que moral ele tem pra falar assim? Ele sofre a mesmíssima rejeição que eu!”, rebateu o pronome eliminado. “Eu esqueço disso, mas nunca me esqueço disso”. Enquanto isso, nas redes sociais, espectadores do reality language reagiam indignados às declarações do ex-BBB: “Você já deu o seu showzinho... o ‘nos’ e o ‘vos’ foram cancelados por muito menos”, disse a convidada de um podcast no Spotify. “Quanto vitimismo... se a língua não lembra mais de usar você, aceita que dói menos”, postou um usuário do Facebook. “Ele tem uma vibe pesada demais pra nossa sintaxe. Foi tarde”, comentou um instagrammer. “É a economia linguística, estúpido!”, tuitou uma fã do programa. Quanto a esta última declaração, a apresentadora observou que, de fato, o apagamento dos clíticos em verbos pronominais e reflexivos é consequência natural de economia na língua, que está sempre optando por maior agilidade e rapidez no discurso. “Mas isso é papo de brasileiro... pode crer que em Portugal sou mais bem falado”, justificou-se o excluído. A apresentadora tentou consolar o eliminado, dizendo que, mesmo afastado agora da companhia de vários verbos pronominais e reflexivos, ainda consegue emprego como palavra expletiva e pronome de realce em linguagem emotiva e afetiva, com função enfática, como em “ir-se”, “rir-se”, “ufanar-se”. “Mas aí não vou ter função sintática alguma”, reclamou o entrevistado. “Mas é um uso estilístico... te confere estilo”, ponderou a linguista. “Só me empregam nesses verbos como elemento decorativo. Quero me envolver mais diretamente com pessoas, de preferência com terceiras pessoas... tanto do singular quanto do plural!”, retrucou o clítico. Ao fim da entrevista, Ana Maria lembrou que o clítico poderia mudar de área e se candidatar às vagas de apassivador e índice de indeterminação, mas o convidado, desiludido, já havia se retirado do estúdio. A linguista então se riu da situação: “Foi-se embora o coitado”. Outro clítico muito apegado a verbos pronominais e reflexivos, o pronome me – que teve 34,89% de votos no paredão – deve ser o próximo eliminado.
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